Personas

O uso da ferramenta Persona se popularizou nas áreas de marketing, vendas, dentre outras, por oferecer mais detalhes sobre quem é o cliente. No desenvolvimento de software, o Ator é a figura usada para representar usuários e clientes, mas considerando os detalhes oferecidos pelas personas, ela pode ser estendida à times de desenvolvimento para contribuir com softwares que entreguem um valor real ao cliente.

Um software é construído para atender uma necessidade, sendo assim é possível afirmar que todo software tem a finalidade de resolver um problema ou dificuldade. Por trás deste problema ou dificuldade normalmente temos a figura do usuário, que são os reais clientes de um software.

Nas literaturas tradicionais de desenvolvimento de software o usuário normalmente é representado pela figura do “Ator”, porém uma figura que ganhou espaço nos processos de desenvolvimento de produto e por consequência de software é a Persona.

Persona é a representação fictícia do cliente ideal para um negócio. É baseada em dados e características de clientes reais como: comportamento, dados demográficos, problemas, desafios e objetivos. A persona se consolidou como uma ferramenta de segmentação de mercado.

A persona como conceito e ferramenta nasceu na década de 90, tendo como pai Alan Cooper, um designer e programador de softwares, que também é conhecido como “Pai do Visual Basic”. Originalmente ela surgiu como uma forma de criar empatia e internalizar aos times de desenvolvimento a mentalidade das pessoas que eventualmente usariam o software que ele estava projetando.

A ferramenta foi adotada por vários segmentos de mercado, sendo mais recentemente alavancada como peça chave no mundo de marketing por ter aprofundado o conceito de público alvo na era digital.

A expansão do uso como ferramenta fortaleceu ainda mais a importância dela no processo de desenvolvimento de software. A sequência deste tema apresenta a relevância dela no uso por times de desenvolvimento e como ela pode também ser aplicada a outros contextos.

Personas vs Atores

Embora sejam artefatos de ferramentas diferentes, cuja finalidade também difere, personas e atores (UML) buscam representar aquele que irá utilizar o software.

Um ator nas definições de UML, é a representação de um papel ou tipo de usuário dentro de um caso de uso. Desta forma um ator não possui profundidade com relação a quem de fato pode ser esse usuário, o que na prática tem contribuído na construção de softwares que não entregam o valor esperado e/ou são “difíceis” de serem utilizados pelo cliente real.

A persona nasceu justamente para aprofundar a visão com relação aos atores. Abaixo um comparativo que ilustra melhor a diferença entre eles:

Personas vs Atores

Tal comparação não busca determinar qual é a melhor, ambas têm sua aplicabilidade, porém ajuda a visualizar que para desenvolver software que entregue valor real para a pessoa que o usará, é importante conhecer mais detalhes sobre estas pessoas. A seguir um exemplo de personas.

Um projeto fictício de nome Guia Hóspede, o qual está desenvolvendo uma solução para reservas de hotéis definiu como um dos segmentos de clientes sendo os Viajantes (Hóspedes). Abaixo, as personas elaboradas pelos responsáveis pelo produto/negócio.

Persona, Fernando

Fernando, 38 anos, formado em Gestão Comercial

Atua de forma terceirizada como representante comercial em uma empresa de revenda de equipamentos agrícolas.

Casado, com 2 filhos, reside em uma cidade no interior de SP e busca sempre equilibrar seu tempo entre família e as viagens que precisa fazer pela empresa. Tem facilidade com tecnologia, redes sociais, e utiliza constantemente um smartphone para facilitar seu trabalho.

Objetivos: Como atua como terceirizado, arca com custos das viagens. Deseja gastar menos tempo na busca de hotéis com melhor custo e que se encaixam melhor nas rotas que faz para visitar clientes.

Dificuldades: Conexão de internet em vários lugares que visita, não consegue ou perde muito tempo ao utilizar sites de reserva, seja por falta da conexão ou lentidão dos sites. Tem poucos momentos vagos entre atenção para família e deslocamento entre clientes, então é um problema ter que também gastar tanto tempo para escolher e reservar os hotéis.

Persona, Regina

Regina, 72 anos, formada em História, com especialização em História da Arte

Aposentada, casada a 48 anos e 1 filho, reside em Curitiba-PR. Não usa redes sociais, tem dificuldades com smartphones, mas consegue acessar seu email e navegar na internet usando seu laptop, embora quando navegue em sites, se sinta um pouco perdida quando há muitos anúncios.

Objetivos: Agora aposentada, está dedicando tempo para viagens às mais variadas cidades, pequenas e grandes. Como o valor da aposentadoria não é alto, precisa planejar bem suas viagens com relação a custo e como dispõe de tempo para isso, está sempre buscando melhores preços para então definir data das viagens, porém gostaria de não ficar diariamente fazendo buscas da mesma coisa para encontrar o melhor preço.

Dificuldades: Precisa sempre ficar acessando vários sites e fazer buscas diariamente até conseguir encontrar valores desejáveis. Além disso, sente dificuldade em navegar pelos sites, todos são muito carregados de informação e anúncios o que a deixa confusa.

Neste exemplo, ao trabalhar apenas com a figura de atores, a visão de Fernando e Regina ficaria restrita a “Viajantes” ou “Hóspedes”. Vários pontos descritos no perfil deles poderiam ser assimilados por casos de uso, porém não se teria algo importante que a persona mostra, o motivador real destes clientes precisarem de determinados recursos.

Ao trabalhar com persona, fica claro que não bastará apenas entregar uma solução que permita buscar hotéis, comparar preços e fazer a reserva. Uma entrega com isso será uma entrega válida, poderá seguir as melhores práticas de engenharia, mas resolverá o problema real dos clientes?

Ter em mão as personas, seja na fase de planejamento ou implementação do software tornará possível por exemplo pensar em soluções como:

  • Busca por hotéis de forma “offline”, onde Fernando poderá informar os dados do que procura e o aplicativo faça a busca no momento que tiver acesso a internet, e assim que tiver um resultado avise o Fernando através de uma notificação.
  • A busca do hotel para o Fernando pode considerar dados relacionados à rota que ele deseja fazer, e assim as opções apresentadas para ele podem estar levando em conta o caminho mais eficiente, diminuindo o custo de deslocamento.
  • Para a Regina, que não usa smartphones e tem dificuldade com anúncios nos sites, o site poderá ser mais amigável a essa condição, facilitando para ela o uso.
  • A busca realizada pela Regina pode ser salva pela solução e periodicamente pode ser avaliado automaticamente se os preços melhoraram, até chegar a um preço ao qual a Regina tenha informado ser acessível, e assim avisar ela por email.

Essas questões podem se desdobrar em épicos, histórias, até casos de uso se o time preferir. A vantagem ao usar personas, é que todo o contexto e motivação para cada detalhe se torna muito mais consistente e compreensível.

Uma persona não substitui em todas as situações a figura do ator, principalmente quando o usuário do software refere-se a um sistema ou dispositivo.

Personas normalmente estão mais ligadas a histórias do usuário. Times podem optar por usar casos de uso, o que dá sentido a figura do ator, mas ainda assim recomenda-se sempre que possível o uso ou associação com as personas, pois elas contribuirão de forma mais profunda para implementações que resolvam o problema das pessoas reais.

Personas do negócio

O tipo de persona que melhor representa os clientes do negócio é a Buyer Persona, a qual é detalhada no tópico seguinte. As personas normalmente são elaboradas pelos profissionais de design, produto, negócio ou marketing. Elas são fruto de um trabalho de pesquisas com clientes ou possíveis clientes.

Por este motivo, caso os times de desenvolvimento optem por trabalhar com personas, recomenda-se solicitar a esses profissionais o acesso ou elaboração das personas. Vale como aprendizado, caso haja espaço para tal, a participação de desenvolvedores(as) na elaboração.

Algumas dicas no uso de personas no dia a dia:

  • Tornar visível a todos nos times de desenvolvimento.
  • Novas personas e atualizações podem ser apresentadas verbalmente aos times.
  • Novos integrantes em um time devem ser “apresentados” as personas.
  • Apresentações e/ou demonstrações de entregas podem usar as personas, reforçando a memória dos times e revalidando sempre o propósito do software de atendê-las.

Tipos de personas

Na evolução da ferramenta personas, alguns tipos surgiram com a finalidade de direcionar melhor a forma de elaboração das mesmas. Segue os principais tipos:

  • Buyer Personas, representam o consumidor e são na maioria dos casos as personas do negócio que o software atenderá. Por ter foco no consumidor é amplamente usada no mundo de marketing. Para conhecer mais veja 5 passos para criar uma persona, e a importância das personas para uma empresa.
  • Proto personas, também representa o consumidor, porém é criada através de sessões de brainstorming realizadas pela própria empresa sem usar dados de pesquisas com os cliente.
  • Audience personas, representam o perfil dos usuários que consomem materiais da empresa. É usada com a finalidade de aumentar a audiência e visibilidade da marca.
  • Brand personas, que está direcionada a composição de como as pessoas veem a empresa.

Para times de desenvolvimento, a Buyer e Proto personas são as de maior impacto para a construção de software.

As personas não possuem uma limitação com relação ao contexto aplicado, desta forma, áreas como a de suporte ao cliente e operação de TI, embora não sejam o cliente da empresa, demandam necessidades ao software. Nesse sentido, é válido usar a ferramenta de personas para tornar claro o perfil, objetivos e dificuldades destas áreas com relação ao software desenvolvido.

Suporte ao cliente como persona

Um software bem construído quando é entregue não deve depender mais das pessoas que o codificaram.

Partindo deste ponto, deve ser possível que o suporte ao cliente seja realizado por times que não participaram da codificação do software.

Em algumas culturas, metodologias ou movimentos há um estímulo para que times de desenvolvimento participem ativamente no processo de suporte ao cliente, e há valor nesta questão, porém essa participação deve ser por uma escolha estratégica do time e não porque a única ou mais rápida forma de resolver o problema do cliente seja recorrer a quem codificou ou conhece o código.

No tema Suporte e Operação essa questão é melhor detalhada, aqui o ponto a ser apresentado é: as pessoas que dão suporte ao software podem ser personas.

No processo de suporte normalmente é necessário o acesso e/ou ajustes de dados da solução. Isso torna necessário que o software seja construído viabilizando tal possibilidade. Elaborar uma persona focada no perfil das pessoas que farão o suporte ajudará aos times tratarem de forma adequada essa necessidade.

Seguindo o exemplo do Guia Hóspede, segue a persona de alguém que atua no suporte ao cliente.

Persona, Fábio

Fábio, 20 anos, iniciando graduação em Design, deseja conhecer mais sobre Customer Experience

Atua na área de suporte ao cliente na empresa Guia Hóspede.

Solteiro, mora com sua mãe na cidade de Florianópolis-SC. Estudioso, apaixonado por tecnologia e por interagir com clientes. Está no início de carreira profissional e tenta equilibrar seu tempo entre trabalho, estudos e auxílio à sua mãe.

Objetivos: Trabalhando diretamente no contato com clientes deseja aprender a interagir e resolver problemas do cliente. Acredita que isso contribuirá para sua formação profissional. Deseja ter maior autonomia para resolução dos problemas dos clientes, trabalhando em uma solução mais madura e preparada para suporte ao cliente.

Dificuldades: Não consegue resolver o problema do cliente através de uma boa experiência quando precisa recorrer à desenvolvedores(as). Sempre que isso ocorre, em função de desenvolvedores(as) estarem ocupados trabalhando para as novas versões, o tempo de resolução sobe muito e isso o deixa frustrado. Tenta aprender e assumir a execução de tarefas técnicas como comandos na base de dados, mas isso é bastante complicado já que ele não é um dev e não deseja ter que aprender “coisas de dev”.

Ao olhar para essa persona é possível perceber que não se trata apenas de “suporte ao cliente”, se trata de dar condições de a empresa prover uma boa experiência ao cliente quando ele precisar de suporte. A boa experiência passará então pela persona citada acima, se ela conseguir exercer bem sua atividade e estar satisfeita com seus resultados.

Sobre esse tipo de persona, é importante então que times de desenvolvimento avaliem a cada entrega questões como:

  • Se ocorrer algum problema com essa funcionalidade, o suporte conseguirá atuar?
  • A forma de resolução dos problemas será amigável ou o suporte terá que saber “coisas de dev”.
  • Se não houver resolução, terá que recorrer ao time de desenvolvedores(as)? O que pode ser feito para evitar isso?

Operação de TI como persona

Assim como para a questão do Suporte ao cliente, o tema Suporte e Operação trata com mais detalhes a Operação de TI. E assim como o Suporte, ela também pode ser uma persona.

Manter o software em execução, monitorá-lo e analisar desempenho são algumas das tarefas que um time de operação pode realizar. É adequado que isso possa ser realizado sem a dependência de desenvolvedores(as), logo os times de desenvolvimento precisam então considerar como viabilizar isso durante a implementação. Sendo assim, olhar para a persona de uma pessoa na operação contribui.

Seguindo o exemplo do Guia Hóspede, segue a persona de alguém que atua na operação.

Persona, Diego

Diego, 28 anos, graduado em Rede de Computadores, fazendo pós graduação em Computação em Nuvem

Atua como líder na área de Operações e Infraestrutura de TI na empresa Guia Hóspede.

Casado, sem filhos, mora na cidade de Florianópolis-SC. Organizado e metódico está sempre conectado e monitorando as soluções da empresa. Busca sempre ter em mãos o máximo de informações sobre o funcionamento delas para poder ser ágil e rápido na resposta e resolução de problemas, o que contribui no equilíbrio que procura ter entre o tempo disponível para a empresa e para a família.

Objetivos: Deseja ter condições para ser pró ativo, trabalhando antecipadamente sobre situações de risco para o funcionamento das aplicações. No seu dia a dia quer ter em mãos o maior número de informações possíveis que indiquem a saúde das aplicações para lhe auxiliar na tomada de decisões.

Dificuldades: Não consegue monitorar adequadamente várias aplicações pois estas não seguem alguns padrões estabelecidos com os times. Em função disso não consegue ser pró ativo, pois não recebe notificações automáticas sobre várias questões destas aplicações e quando problemas ocorrem precisa atuar de forma emergencial, o que gera problemas para clientes, e muitas vezes toma seu tempo livre fora da empresa. Em várias situações precisa recorrer à desenvolvedores(as) para conseguir restabelecer o funcionamento de aplicações, o que nem sempre é tão fácil pois problemas ocorrem fora do horário de trabalho.

Essa persona deixa claro que para área de Operações da empresa fazer bem seu trabalho o software precisa ser implementado considerando as necessidades desta área. Além de que falhas na construção do software podem influenciar negativamente no tempo e vida pessoal dos integrantes do time de operações.

Sobre esse tipo de persona, é importante então que times de desenvolvimento avaliem a cada entrega questões como:

  • Os serviços de monitoramento poderão coletar e acompanhar todas as informações necessárias que o time de Operações precisa?
  • Em casos de falhas na execução da aplicação, o time de Operações terá condições de restabelecer o adequado funcionamento?
  • Todas as informações para implantação e execução do software estão disponíveis ao time de Operações, ou há dependências do time de desenvolvedores(as)?

Atender aos objetivos e resolver as dificuldades das personas de Suporte ao cliente e Operações de TI é por consequência também atender bem as personas do negócio.

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